sexta-feira, 31 de julho de 2009

GRANDES ENTREVISTAS: GILBERTO GIL


Aroldo Pedrosa

O ministro da Cultura do Brasil veio finalmente ao Amapá. Um acontecimento inédito que vai entrar para os compêndios da nossa história. E eu vou repetir para que não paire na cabeça do leitor nenhuma dúvida: nunca, antes de 28 de abril de 2008, o Amapá recebeu um ministro da Cultura do Brasil. Até presidente da França já esteve por aqui, mas ministro da Cultura... NUNCA!
E o ministro, provocador da quebra desse ineditismo absurdo que já vai tarde, tinha que ser exatamente o tropicalista e doce bárbaro baiano Gilberto Gil.
Gil veio ao Amapá para anunciar o lançamento do
Programa Mais Cultura do MinC, mas estimulado também pelos bons e envolventes ventos culturais que sopram em nossa direção. Que ventos são esses?! Ora, o mais soberano e cultural de todos – só o bloco dos parauaras ressentidos contesta essa afirmação – vem do ruflar das asas do Brilho de Fogo no Sambódromo, quando a Beija-Flor de Nilópolis, ao bater no peito, fez converter espetacularmente em seu enredo as nossas potenciais exuberâncias, conquistando assim o título de campeã do Carnaval 2008. Esses ventos – olha o bloco dos parauaras ressentidos aí de novo – são ventos do norte! Ventos que foram à cidade do Rio de Janeiro, fizeram um ziriguidum por lá e estão aqui de volta trazendo na sua insustentável leveza o cordial ministro Gilberto Gil para dar pessoalmente “aquele abraço” na nossa gente e nesse pedaço de floresta e cultura amazônicas que estão a pulsar natural e literalmente no meio do mundo.

Vanguarda:
Inicialmente eu queria saudar a vinda do ministro da Tropicália – eu prefiro chamá-lo assim – ao nosso Estado. E, aproveitando o ensejo, queria convidá-lo – eu sei que não está na sua agenda – a visitar o monumento Marco Zero do Equador, que é o ponto mais emblemático de Macapá, por onde passa a linha imaginária que divide o mundo. E a minha pergunta é a seguinte: nós, que moramos na Amazônia, e, sobretudo, no Amapá, sempre estivemos muito isolados do resto do Brasil, e – pelo menos nos últimos cinqüenta anos, a começar pela Bossa Nova, passando pela Tropicália que faz 40 anos – todos os movimentos de renovação da cultura brasileira ocorreram ou ganharam ressonância no chamado eixo Rio-São Paulo. O que nós da Amazônia – e eu digo “nós” porque eu também sou compositor popular – podemos esperar do governo Lula, para que seja rompido esse isolamento?

Gilberto Gil:
Não creio que seja conveniente aqui tecer considerações se a história cultural brasileira tem sido generosa ou não com a Região Amazônica. Apesar do isolamento natural que essa região tem do resto do Brasil, por causa das suas características geográficas, ecológicas, etc., e mais ainda por causa da sua condição demográfica, uma região de imenso território e pouca população, comparada a outras regiões do Brasil, enfim... Mas não quero aqui cometer injustiças, uma vez que temos representantes exponenciais da vida cultural amazônica, pra citar um: o poeta Thiago de Mello – é amazônico e tem dado uma contribuição extraordinária à cultura do Brasil. Pra citar outro, na área da música: João Donato – também amazônico e tem dado extraordinária contribuição à música. Nós temos ainda no Pará músicos, maestros, compositores... Na capital amazonense – Manaus – temos o Teatro Amazonas que, ao longo da história, tem prestado serviços inestimáveis à vida cultural brasileira. Então, de certa maneira, ainda que, não no nível, mas na medida necessária, o país tem fruído um pouco da dimensão amazônica na sua cultura. E isso evidentemente que precisa ser intensificado. Intensificado com ações governamentais, com políticas públicas que digam respeito diretamente à cultura, políticas indiretas em outros setores que possam rebater na cultura, como agora, por exemplo, está tentando fazer o ministro Mangabeira Unger [Ministério para Assuntos Estratégicos] em trazer uma nova dimensão de desenvolvimento para a Amazônia. Uma nova dimensão de desenvolvimento, de fortalecimento do empreendedorismo local, do médio e micro negócio para a região. A capacitação da Amazônia, para que ela possa compartilhar novas tecnologias, novos processos econômicos e modelos de negócios, na medida em que seja devidamente implantado na Amazônia, e que ela responda positivamente a esses novos estímulos. Isso deverá impactar o fator cultural amazônico, nela, na própria Amazônia, e no resto do Brasil. Essa é a nossa expectativa com a cultura. Manifestações recentes como as que ocorrem em Parintins, que até bem poucos anos eram absolutamente ignoradas. A contribuição indígena para essa cultura moderna, contemporânea do turismo, dos grandes fluxos culturais ligados aos negócios e ao entretenimento. Isso era uma coisa absolutamente inexistente até bem pouco tempo. Hoje, manifestações como as de Parintins já são reconhecidas pelo Brasil dessa dimensão importante da Amazônia. À proporção em que tenhamos capacidade de transferir populações de outros lugares do Brasil para a Amazônia, populações interessadas no empreendedorismo, em explorar a região nas suas várias possibilidades, poderemos a partir daí capacitar melhor as populações amazônicas para o exercício de suas vidas nas várias formas de cultura e nas várias formas de produção. Obviamente que isso não é trabalho para um governo só, para uma gestão só, mas trabalho para uma sucessão de governos daqui pra frente. É como o professor Mangabeira diz: “É preciso ter marcos e processos iniciais que antecipem e que sejam uma prestação, paga agora, desse futuro amazônico no Brasil e desse futuro brasileiro na Amazônia”.

Um comentário:

Netto de Deus disse...

Muito Bom, Pedrosa!
Sou joão de Deus Netto, designer gráfico, caricaturista, blogueiro do PICINEZ (caricaturas de literats) e piauiense radicado em Curitiba. Aparece lá; você encontrará um time, também, de primeiríssima qualidade.

http://myblog-jenipapoirado.blogspot.com/

A URL tem nada a ver com o blog, no conteúdo.