quinta-feira, 5 de novembro de 2009

VIVA LEILA DINIZ!


Orivaldo Fonseca
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Rio de Janeiro, agosto de 1971, praia de Ipanema. A atriz Leila Diniz choca a sociedade puritana e os milicos da ditadura ao expor sua barriga de grávida, trajando um inadmissível biquíni para uma mulher em um estado tão imaculado.
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Ela, que era formada em Magistério e que conhecia muito bem o ambiente escolar – professora que era – e que não tinha papas na língua quando o assunto era sexo (“eu trepo de manhã, de tarde e de noite e tem homem paca por aí”); ela que, segundo Carlos Drummond, era a “professorinha ensinando a crianças, a adultos, ao povo toda a arte de ser sem esconder o ser”; ela, que fez estremecer todas as bases, vem-me servir de luz para estes tempos em que sexo, escola e caretice se mesclam perigosamente.
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Belém, 24 de outubro de 2009, vestiário da Escola Estadual Ulysses Guimarães. Adolescentes da oitava série fazem sexo e se deixam filmar. Como peste, o vídeo se espalhou na internet e trouxe a reboque a discussão a respeito da velocidade com que as informações, boas ou ruins, são veiculadas, e da velocidade, maior ainda, com que as crianças deixam de ser crianças. E com a desenvoltura que me faz a mim sentir-me um infantil.
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Quando questionados a respeito do vídeo, que logicamente estava em todos os celulares dos pimpolhos, os alunos da escola alternaram-se entre a indiferença e o machismo precoce. Uns diziam que aquilo não era nada, porque havia vários outros vídeos como aquele sendo produzidos costumeiramente na escola. Outros mostravam-se indignados porque não admitiam que uma aluna tão aplicada fosse capaz de fazer "aquilo". Como se "aquilo" fosse prerrogativa só das burras. Sobre o pequeno garanhão; não, sobre o jovem garanhão, nada.
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São Bernardo do Campo, 22 de outubro de 2009, pátio da Universidade Bandeirantes de São Paulo (Uniban). Uma estudante de 20 anos do curso de Turismo é assediada em massa por colegas e funcionários da universidade por estar vestindo uma minissaia. O caso ganhou repercussão quatro dias depois, mais uma vez graças aos celulares e à internet, e trouxe a reboque a discussão a respeito da intolerância selvagem e demagoga que permeia a elite intelectualóide brasileira, e de como a massa tupiniquim se revolta pelos motivos mais cretinos e desimportantes.
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Quando questionados a respeito do fato, estudantes da universidade alternaram-se entre o machismo estuprador dos rapazes e o machismo invejoso das moças. Um deles dizia: "A maneira como ela estava vestida lembrava uma garota de programa". E uma delas completava: "Vestida daquele jeito, ela estava mesmo querendo aparecer. Recebeu o que merecia". Esses dois depoimentos traduzem de forma exemplar o preconceito e o despeito que gritam dentro dessas cabecinhas ocas. Quer dizer que uma garota de programa não pode frequentar uma universadade? Quer dizer que não há um eterno desfile de modas entre as patricinhas nas faculdades? É muita bobagem saída de bocas que deveriam dizer exatamente como combater tais mazelas.
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Viva Leila Diniz! Viva Leila Diniz! Ela responderia à altura aos linchadores da Uniban, depois mostraria como se faz um bom sexo no vestiário da escola.
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O autor é compositor, poeta e operador de tráfego aéreo. Nasceu em Belém (Pará), passou uma temporada no Amapá (onde não se deu) e hoje vive em João Pessoa (Paraíba). É articulista da revista Vanguarda e das páginas eletrônicas amapabusca.com.br e chicoterra.blogspot.com.

Um comentário:

Ori Fonseca disse...

Meu querido amigo e parceiro, agradeço pela reproduçao do artigo nesse espaço de tão bom gosto. Não creio ser eu merecedor de tanto. Por outro lado, permita-me discordar da referência segundo a qual eu não me dei em Macapá. Dei-me,e muito bem, nos seis anos e meio em que aí morei. Dou-me ainda, pois acompanho os acontecimentos daí, graças a veículos como esse seu que não deixo de visitar. Dou-me com minha mosdesta produção para um dos sítios mais acessados, que é o do nosso amigo Chico Terra. Meus pés saíram daí, mas minha cabeça continua rolando na linha do Equador.
Um grande beijo.